Lewis Hamilton em foco

CHUTA AO GOL, RAPAZ!
por Rafael Ligeiro
São Paulo (BR), 06 Jun 2007

Ao redigir recentemente a notícia de que Lewis Hamilton estaria prestes a trocar a McLaren pela Ferrari, conforme boatos no paddock da Fórmula-1, o jornalista Edward Gorman, do periódico inglês The Times, se colocou no papel daquele jogador de futebol que está desmarcado, frente-a-frente com o goleiro adversário, e arrisca um toque de letra ao gol. Se houver êxito na conclusão, será um golaço - ou melhor, um furo jornalístico de primeira grandeza, lembrado por um bom tempo e garantia de história a contar aos netinhos. Já se a bola não entrar... Bem, aí está uma diferença entre o jornalismo e o futebol. No esporte bretão, o jogador dificilmente escapará do xingamento da torcida e de um puxão de orelha do treinador. "Chuta de bico, garoto! Gol é o que importa!". Agora, no "mundo das notícias", quando um boato não se concretiza é facilmente esquecido...

Logicamente, não critico a atitude do colega britânico. Esse papo de Hamilton na Ferrari certamente não foi invenção dele. Ou Gorman está muito bem de fontes jornalísticas no paddock da Fórmula-1 ou ele se contagiou pelo diz-que-diz de alguém lá na Ferrari, apenas impressionado com o trabalho de Hamilton nas pistas. Nessa segunda hipótese, o fato do boato envolver um compatriota é até mais importante que o resultado, ou seja, a possibilidade daquele rumor tornar-se algo verídico. Aliás, no Brasil, quantas vezes nosso Rubinho, ao longo de seis anos pela Ferrari, não passou por aquele popular refrão que deve ilustrar pára-choques de milhares de caminhões pelo País: "Ele vai ser demitido da Ferrari"?

Jornalismo à parte, de fato uma eventual transferência de Lewis Hamilton para o time italiano soa de modo estranho. Apesar de qualquer esbravejo do jovem inglês por não ser o número um da equipe de Woking, após o GP de Mônaco, Lewis dificilmente chegaria à Ferrari para ser primeiro piloto. Para ganhar a preferência dos italianos, teria de bater, logo nas primeiras corridas, um concorrente tão completo quanto o atual companheiro de McLaren, Alonso: Felipe Massa. Motivado, o brasileiro é dono de um talento inquestionável e conta com três anos de experiência pela Ferrari, tempo em que conquistou o carinho dos cartolas da equipe. Além disso, vale ressaltar que Ron Dennis certamente não vai deixar o pupilo saltitar a Maranello tão facilmente. O dirigente aposta em Lewis desde os tempos de kart e sabe o piloto que "tem em mãos".

Aos 22 anos, Hamilton reúne alguns dos principais ingredientes para ser um dos grandes nomes da categoria: é agressivo e ousado nas pistas, mas também inteligente - sabe o momento de administrar um resultado, segurar a pressão de um adversário. Como e até onde ele vai desenvolver essas virtudes nas pistas ao longo da carreira são quesitos determinantes para saber se Lewis poderá almejar vitórias sucessivas e títulos na Fórmula-1. Muitos pilotos chegaram à categoria mostrando muito serviço, mas tropeçaram em algum instante - como Jacques Villeneuve. Para Ron Dennis, que já trabalhou com Alain Prost, Ayrton Senna e Mika Häkkinen, lapidar Hamilton não é tarefa das mais complicadas, até porque o inglês mostra-se, até o momento, muito centrado e profissional.

Sinceramente, apesar dessas virtudes, Hamilton ainda não tem lugar na Ferrari. Massa se consolida a cada corrida como grande nome da escuderia italiana. Aliás, Räikkönen - que conforme a matéria do The Times seria o substituído pelo inglês - já mostrou ser um grande piloto em diversas ocasiões por Sauber e McLaren. Seria injusta qualquer fritura ao Homem de Gelo e até improvável. Os italianos apostaram alto em Kimi. Além disso, em cinco corridas, o desempenho do finlandês não deixa a desejar. Pelo contrário. O problema é que, desde a contratação de Kimi pela Ferrari, criou-se a expectativa de que o ex-piloto da McLaren iria ter vida fácil na escuderia italiana, seria um novo Michael Schumacher. Mas, todos se esqueceram de Massa...

Por fim, outro quesito que poderia atrair Lewis à Ferrari é o bom e velho dinheiro. Na matéria publicada no The Times, Hamilton ganharia na Ferrari aproximadamente 40 milhões de dólares por temporada. Atualmente, o inglês fatura entre 500 mil e dois milhões de dólares na McLaren. Companheiro de vice-líder da temporada 2007 na equipe dos carros prateados, Alonso, fatura mais de 30 milhões por ano, ao passo que Massa ganha no mesmo período "apenas" oito milhões. Mas não duvide que Ron vai incrementar o salário de Hamilton brevemente - nem que para isso tenha de fazer Mansour Ojjeh e a cúpula da Mercedes-Benz colocar a mão no bolso em busca de alguns tostões... Aliás, na época em que o inglês mal figurava na lista de pretendentes ao segundo posto na McLaren, o time inglês teria oferecido mais de 64 milhões de dólares para manter Kimi Räikkönen em um de seus carros para os campeonatos 2007 e 2008, algo que mostra que grana não é problema lá por Woking.

Gorman esteve na cara do gol e já concluiu. Resta apenas saber onde essa bola vai parar. Se ele acertar, o treinador da Inglaterra, que por sinal tem McLaren no sobrenome, deve dar a camisa dez para ele.


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